segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O RESTO É SILÊNCIO



Acompanhado de sua bengala, caminhava a passos lentos e muito bem escolhidos desviando de obstáculos que estavam em seu caminho para não tropeçar.
De paletó branco e óculos escuros, nunca revelando os olhos, já era personagem conhecido do povo que freqüentava o mercado municipal.
Sentava-se sempre no mesmo local; com a bengala encostada no banco da praça a sua direita e o mais ereta possível, o chapéu em posição de descanso sobre ela, parecendo um homenzinho magrelo de alumínio escondendo seu rosto, seu principal espectador.
Habilidoso nas cordas do violão e abençoado nas vocais, obrigava todos os transeuntes reunirem-se ao seu entorno e apreciar as notas bem tiradas das cordas cuidadosamente afinadas do velho amigo.
Detentor de uma voz aveludada conseguia transmitir com profundidade a letra da música, derrubando as portas dos corações mais endurecidos; arrancando lágrimas e embargando vozes, tamanha a emoção que a interpretava.
A mesma emoção era evidente no detalhe de cada rosto ali presente; alguns enxugando as lágrimas com lenço, outros levantando o rosto para que elas não escorressem.
Após sua apresentação e a salva de palmas, nada mais restou apenas o silêncio!
O grupo de espectadores se dispersava, cada um seguindo seu destino.
Ele, vaidoso, vestia novamente o chapéu, e ao deixar desnudo o homenzinho magrelo de alumínio, o transformava novamente na amiga e companheira bengala.
Ela voltava a sua função original, de livrá-lo novamente dos buracos, pedras e obstáculos do caminho, e ainda protegê-lo de algumas investidas raivosas de cachorros de rua mal informados de que ali caminhava um artista, e merecia todo o respeito.
Novamente, a passos lentos, alinhado na vestimenta, com o violão numa das mãos e a bengala na outra, retornava para sua casa em silêncio.
O mesmo silêncio, que provocara após as palmas que o aclamaram.

Essa é a pérola do dia.
Pense nisso!
Twitter @alcirchiari

11 comentários:

  1. Consegui imaginar o cenario certinho, gosto de materia assim rsrsrsr

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  2. Adorei a pérola pai. Te amo. Bjo Bjo

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  3. Todos seres humanos por mais que sejem dotados de grandes feitos...sempre no findar de suas vidas deixam-se uniformizar-se...Assim também são algumas das pessoas humildes que por alguns instantes da vida deixam-se revelar sua grandeza............

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  4. Silencio , fato dificel nos dias de hoje.

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  5. fuzilaska@hotmail.com5 de setembro de 2011 às 21:37

    poucos momentos em que o ditado prevalece "dois ouvidos, uma boca"

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  6. Vejo nessa Pérola duas coisas importantes: 1- a capacidade de superação de quem carrega uma deficiência. 2- o repsito pela competência.

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  7. É realmente tem pessoas que tem uma força interior muito grande e nos faz repensar vários aspectos de nossa vida.....

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  8. Perto de casa, sempre tem um ceguinho que toca violão! Toca muito bem por sinal!
    Contagia a todos!

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  9. A história é triste, ams quantos velhinhos não vemos por aí, abandonados, sem família...

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  10. Aqui na nossa rua, tudo sábado de feira,lá está ele,fazendo mais um espetáculo. Será o mesmo artista da pérola?!Não pode enxergar, mas tem muito talento para a música. A sua deficiência, com certeza é um exemplo de superação.

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  11. No nosso mundo tem pessoas assim que se tornam caraterística de um local.
    Ponto de referência.
    A deficiência de um órgão nos torna hábeis em outros, desenvolvemos habilidades mais fortes em outras partes ou aspectos.
    Outro ponto é que todo ser humano precisa ser elogiado, aplaudido e valorizado, e é esse, talvez, o "combustível" que essas pessoas vão buscar na rua para manter sua alto estima nas nuvens.
    Penso até que sua verdadeira bengala seja os aplausos e elogios recebidos.
    O que o faz voltar pra casa alegre e feliz, e lhe dá força para que no outro dia ele se levante, se arrume e saia na rua em busca, novamente, de seu alimento.

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