A única alternativa naquele momento era encararmos caminhando aqueles oito quilômetros, do sítio onde morávamos até a cidade.
Eu estava muito mal, andava cambaleando de um lado para o outro, com dores abdominais insuportáveis, calafrios, fraqueza e muita febre. Precisava urgentemente de atendimento médico.
Morávamos num sítio da prefeitura da cidade onde era feita toda captação de água para o município. Meu esposo era o responsável pela limpeza e manutenção das bombas. Vivíamos na simplicidade sem nenhuma condução para nos locomovermos.
Minhas filhas de seis e quatro anos caminhavam junto ao meu esposo e reclamavam de dores nos pés e nas perninhas finas, parando a cada cem metros para descansar.
Ele carregava o nosso bebê, um menino, recém-nascido no colo, e eu mal agüentava as minhas próprias pernas.
As dores e o mal estar me faziam delirar e eu pedia para morrer, ao mesmo tempo em que pedia perdão a Deus por essas blasfêmias.
O pó da estrada se misturava ao nosso suor e colava em nossos corpos.
Constantemente me sentava para descansar. Estava realmente muito mal.
- Dessa eu não vou escapar - dizia ao meu esposo.
Ele me consolava e tentava me animar para prosseguirmos a caminhada, mas tudo era muito difícil.
- Oh meu Deus, me ajude, preciso criar essas crianças – Eu suplicava com Fé.
Finalmente surgiu uma esperança, um veículo levantando poeira na estrada. Vinha em sentido contrário, mas quem sabe ele poderia nos ajudar. – Pensei.
Acenamos e o veículo parou, era um Jipe com trabalhadores que iriam ao sítio do final da estrada.
- Não posso ajudar, pois estou levando os empregados para o trabalho e já estou atrasado.
A resposta negativa era óbvia, afinal, o Jipe estava indo em direção contrária, mas ao mesmo tempo surpreendente porque quem o conduzia era meu cunhado, irmão do meu esposo.
Pouco se sensibilizou com minha situação e com o alerta para a possibilidade da minha morte. Foi se embora, seguiu seu destino deixando poeira nos nossos olhos.
Na verdade eu estava mais pra lá do que pra cá!
As dores eram muito fortes e eu me contorcia, o desespero era total!
Caminhamos um pouco mais, e a cada cem metros parávamos para descansar. Eu mal conseguia respirar e as crianças choravam e resmungavam.
- Meu Deus, me ajude, tenha misericórdia, mande um anjo da guarda!- exclamei em prantos.
Eis que surge ao longe a poeira de um veículo em velocidade.
Meu esposo acenou com a mão e o veículo conduzido por um rapaz parou uns cinco metros à frente. Ficou sensibilizado com tanto sofrimento e resolveu nos ajudar.
- Deus seja louvado! – Exclamei.
Deixou-nos na porta do hospital, o mesmo onde estive internada por ocasião do parto do bebê.
- Muito obrigado e vá com Deus! - Eu disse antes de desmaiar.
O rapaz seguiu viagem e imediatamente os enfermeiros do hospital me levaram para o pronto socorro.
Hemorragia! - disse o médico ao meu esposo.
Me arrependo até hoje por ter ganho meu filho no hospital, pois tive minhas duas filhas em casa com a parteira e nada me aconteceu, nada de hemorragia.
Não estou culpando o hospital por isso, mas associo os dois partos anteriores, de muita tranqüilidade com esse.
Fique traumatizada com esse hospital, pois precisei de transfusão de sangue para me recuperar da hemorragia e fui contaminada com o vírus da hepatite.
Foram vinte dias internada no hospital e mais dois anos de severo tratamento.
Hoje, já avó, conto essa história aos meus filhos e netos com lágrimas nos olhos e sempre digo que fui salva pelo meu anjo da guarda.
Rezo diariamente para o rapaz que nos deu carona, nem sei o seu nome, o que faz, onde mora, tampouco se esta vivo, mas tenho a certeza que foi um anjo mandado por Deus.
Graças a ele estou viva e posso testemunhar isso a vocês.
Essa é a pérola do dia.
Pense nisso!
Twitter @alcirchiari